Enquanto opositores marchavam em centenas de cidades venezuelanas e no exterior no último sábado para contestar o resultado das eleições presidenciais do dia 28 de julho, o presidente Nicolás Maduro , liderando uma passeata favorável aos chavistas e em defesa da legitimidade de sua reeleição, contestada por seus opositores, pediu neste sábado que a Assembleia Nacional aprove “muito rapidamente” um projeto de lei “contra o fascismo, o neofascismo e os crimes de ódio”. E ainda provocou o candidato da oposição ao Paláco Miraflores, o diplomata Edmundo González Urrutia, que, segundo Maduro, prepara “sua fuga da Venezuela“. A oposição, que contesta o resultado, teme que a nova legislação seja usada para reprimir os que estão na rua denunciando fraude no pleito.
— Estamos enfrentando um povo malévolo, fascista, vocês entendem o que é o fascismo? É o ódio, a intolerância, transformados em violência — afirmou Maduro em frente ao Palácio Miraflores, fazendo referência à coalizão opositora, e acrescentou: — Por isso, apoio com todas as minhas forças o que o povo está fazendo com a Assembleia Nacional e peço que aprove muito rapidamente [a lei] contra o fascismo, o neofascismo e os crimes de ódio.
A “lei antifascismo” propõe a punição a quem promova reuniões ou manifestações que façam “apologia ao fascismo”, além de ter o poder de cassar partidos políticos e aplicar multas de até US$ 100 mil para empresas, organizações ou meios de comunicação que financiem atividades ou divulguem informações que “incitem o fascismo”, tal qual definido pelo regime.
O projeto faz parte de um pacote legislativo enviado por Maduro ao Legislativo em meio ao impasse instaurado após as eleições. Na última quinta-feira, o Congresso, de maioria chavista, sancionou o primeiro deles: o projeto de lei que busca regulamentar as ONGs do país, denunciado por ativistas, defensores de direitos humanos e a comunidade internacional como um meio para reprimir os direitos civis e recrudescer a repressão no país.
Em seu discurso, Maduro afirmou ainda que a oposição “não tem líderes” e questionou o fato de González Urrutia não ter ido às manifestações da oposição deste sábado. O diplomata não aparece em público desde 30 de julho. Ele foi a principal aposta da oposição após a líder de fato do anti-chavismo no país, María Corina Machado, ter sido inabilitada por 15 anos e a indicada para substituí-la, Corina Yoris, ter seu registro negado pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE).
— Onde está escondido Edmundo González Urrutia?! — questionou o chavista, ironizando: — Em uma caverna, e preparando sua fuga da Venezuela.
Assim como a líder da oposição, que, no entanto, participou da manifestação em Caracas neste sábado, Gonzálz Urrutia está na clandestinidade desde que as autoridades abriram uma investigação penal contra ambos por “instigação à rebelião”, entre outros crimes, após denunciarem fraude nas eleições. Em um vídeo publicado nas redes sociais, González Urrutia afirmou que as manifestações de sábado “são uma força que fará respeitar a decisão de mudança”.
María Corina afirma ter cópias de mais de 80% das atas que demonstram, segundo a oposição, a vitória acachapante de González Urrutia e desmentem o resultado oficial de 52% dos votos para Maduro, divulgados pelo CNE. O órgão pró-governo ainda não publicou a apuração detalhada, argumentando que o sistema de votação automatizado foi alvo de um “ataque ciberterrorista
Maduro alegou ainda que se o governo não tivesse “derrotado na segunda-feira, 29 de julho”, as manifestações convocadas pela oposição, eles teriam “ido matar mais de um” dos presentes no evento que defendia, no sábado, sua vitória. Os protestos começaram poucas horas após o CNE divulgar a reeleição de Maduro com 80% das urnas apuradas — e apesar do resultado ser contestado pela oposição e boa parte da comunidade internacional.
O procurador-geral da Venezuela, Tarek William Saab, divulgou na semana passada que pelo menos 25 pessoas morreram e mais de 192 ficaram feridas nos protestos que contestavam a reeleição de Maduro. A ONU, por sua vez, estima que mais de 2,4 mil pessoas foram detidas em meio à repressão do governo, enquanto um novo balanço da ONG Foro Penal, divulgado no sábado, registrou 1.416 detenções, das quais 188 seriam mulheres e 127, menores de idade.
Na última sexta-feira, María Corina denunciou em uma publicação no X que Piero Maroún, líder do partido social-democrata Ação Democrática, “estava com sua esposa e cunhada em um restaurante às 22h20 (de sexta-feira) quando foi detido por três pessoas não identificadas”. Maroún foi libertado no dia seguinte. Já no sábado, em meio ao protestos, partidos e ONGs de direitos humanos denunciaram a prisão de um político, um padre e um advogado.
O secretário de organização regional da sigla Um Novo Tempo (UNT), Carlos Molina, foi detido após participar de uma concentração da oposiçãona cidade de Valência, em Carabobo. De acordo com o partido de María Corina, o Vem Venezuela, “forças repressivas o tiraram de uma van”. A ONG Provea denunciou que o padre Elvis Cabarca foi preso pela Guarda Nacional Bolivariana (GNB) enquanto rezava um rosário em uma capela. O sacerdote foi detido em Puerto Ayacucho, no estado do Amazonas, onde também foi registrada a prisão do advogado de direitos humanos Henry Alexander Gómez Fernández.
Uma jovem, identificada como Mabel Meléndez, também teria sido detida no sábado. De acordo com o jornal venezuelano Efecto Cocuyo, a jovem teria sido responsável pela construção de um tanque de madeira que desfilou em meio aos manifestantes concentrados em Carabobo. A obra trazia as palavras “perdão, reconciliação e união”. Pessoas próximas à jovem disseram que os policiais esperaram que Meléndez ficasse sozinha antes de detê-la.
COM INFORMAÇÕES GLOBO