O clássico mau humor que surge quando sentimos fome pode ter outra origem além da queda do açúcar no sangue, segundo novas evidências.
Um estudo da Universidade de Bonn, na Alemanha, sugere que o fator decisivo para o mau humor é perceber conscientemente que se está com fome, e não apenas as variações metabólicas que ocorrem no organismo.
A pesquisa, publicada na revista eBioMedicine em 9 de dezembro, acompanhou 90 adultos saudáveis, sendo 46 mulheres e 44 homens, durante quatro semanas. Os participantes usaram sensores contínuos de glicose no braço e, duas vezes ao dia, responderam a questionários sobre humor, fome e saciedade. Os dados foram cruzados para entender o que realmente pesava nas oscilações emocionais.
Quando a fome pesa no humor
Os resultados mostram que níveis mais baixos de glicose se relacionaram a uma piora no humor somente quando eram acompanhados pela sensação de fome. Em outras palavras, o desconforto emocional dependia da experiência subjetiva, não apenas do funcionamento interno do corpo.
Entre as conclusões registradas pelos autores, está a de que “não é o nível de glicose em si que melhora ou piora o humor, mas o quanto essa falta de energia é percebida conscientemente”. A sensação atuaria como um gatilho emocional mais potente do que o estado metabólico isolado.
Esse efeito foi ainda mais claro entre as pessoas que disseram perceber melhor os sinais do próprio corpo.
Segundo os pesquisadores, indivíduos que identificam melhor mensagens internas como fome, batimentos cardíacos e saciedade, apresentaram menos oscilações emocionais.
“Notavelmente, indivíduos com maior acurácia interoceptiva apresentaram menos flutuações nas avaliações de humor”, disseram os autores no artigo.
O que é interocepção e por que importa
A interocepção é a capacidade de perceber sensações internas do corpo, como temperatura, sede, fome, respiração e ritmo cardíaco. Pessoas que têm essa habilidade mais refinada tendem a antecipar quedas de energia e ajustar hábitos antes que o mal-estar emocional se instale.
Para os autores, essa sensibilidade funciona como um amortecedor emocional, ajudando a evitar que o humor despenque quando a glicose cai. A descoberta abre espaço para investigar se treinamentos focados em consciência corporal podem ajudar quem sofre com oscilações intensas de humor.
Relação com saúde mental e metabolismo
Os resultados dialogam com condições já conhecidas pela medicina, como depressão, obesidade e resistência à insulina, em que metabolismo e emoções costumam andar lado a lado.
Ao compreender melhor essa ligação, os pesquisadores enxergam espaço para futuras estratégias terapêuticas, que podem incluir intervenções comportamentais e até técnicas de estimulação neurológica.
Embora os achados sejam promissores, os próprios autores destacam limitações. O estudo foi conduzido apenas com adultos saudáveis, o que impede afirmar relação de causa e efeito.
Mais pesquisas serão necessárias para saber se os mesmos padrões se repetem em grupos com doenças metabólicas ou transtornos mentais.
Metrópoles
