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O advogado Robison de Almeida Albuquerque Maranhão pode ser suspenso após uma cena inusitada durante uma sessão. Ele é representante do homem que se escondeu debaixo de uma mesa durante uma audiência virtual nesta quinta-feira numa tentativa de enganar o magistrado que conduzia a sessão no Paraná. O juiz Thiago Mira de Assumpção Rosado, da 18ª Vara do Trabalho de Curitiba, desconfiou que o investigado estava na mesma sala que o advogado, o que não era permitido para aquele momento, e pediu que o defensor mostrasse todo o ambiente.
“O senhor consegue girar a câmera, porque parece que a janela é parecida, só para a gente se precaver”, pediu Rosado, em vídeo que viralizou nas redes sociais.
De acordo com a lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil), o magistrado poderá extrair ofício e remetê-lo à Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Estado do Paraná, para que a conduta do advogado possa ser avaliada pelo Tribunal de Ética e Disciplina (TED) da Seccional.
Segundo a jurisprudência, o advogado pode enfrentar, dependendo da intensidade das infrações éticas e disciplinares, diferentes consequências:
- Censura: estabelecida em infrações leves, normalmente aplicadas de forma reservada;
- Suspensão: advogado está proibido de exercer a profissão por um período, geralmente de 30 dias a 12 meses, em caso de reincidência ou de infrações graves;
- Exclusão dos quadros da OAB: ocorre para infrações gravíssimas, como desvio de dinheiro de clientes ou prática de crimes infamantes;
- Multa: depende de caso para caso.
Gustavo Sampaio, professor do Departamento de Direito Público da Universidade Federal Fluminense (UFF), acredita que Maranhão não deve ter sua licença cassada.
— Pela relevância da conduta (que varia em gradiente que vai da advertência à exclusão), não creio que o profissional venha a ter o registro cassado, mas talvez sofra uma suspensão, o que lhe renderá afastamento temporário do exercício profissional, acaso advenha esta modalidade de decisão sancionatória — explicou ao GLOBO.
Gustavo Bandeira, mestre em direito civil, pensa que a atitude do advogado em pedir que o cliente se escondesse embaixo da mesa abre precedentes para que ele sofra todas as sanções da ei nº 8.906/94.
— Ele dá margem para sofrer uma sanção disciplinar que vai desde censura, suspensão, multa e até exclusão. Nesse caso uma exclusão seria uma sanção desmedida, visto que aparentemente isso não é uma conduta que seja reiterada, assim pensamos, mas que é sim uma conduta que certamente será merecedora de uma sanção disciplinar, pelo menos uma censura ou uma suspensão, a fim de evitar esse desrespeito à justiça. A audiência é uma fase importantíssima do processo judicial e deve ser observada com rigor pelo magistrado que, nesse caso, agiu de forma muito correta — falou.
Em um primeiro momento, Maranhão mostra a imagem em um ângulo onde pouco se via. Enquanto isso, porém, o cliente — aparentemente sem notar que transmitia sua movimentação — inicia uma caminhada e filma a si mesmo entrando debaixo de uma mesa.
“Por que ele entrou debaixo da mesa, doutor? Poxa, vocês estão de brincadeira com o juiz aqui. Só pode ser piada mesmo. Doutor, eu vou oficiar a OAB, é uma palhaçada e uma falta de respeito”, repreendeu Rosado na sequência, determinando a suspensão da audiência. O momento registrado em vídeo viralizou nas redes sociais.
Procurado pelo GLOBO, Maranhão não retornou ao contato. Advogado da outra parte envolvida na ação, Vitor Benin — que não segurou o riso enquanto a cena se desenrolava — classificou o flagrante como “uma situação inusitada”.
— O representante da reclamada ouviu o depoimento da autora da ação, tomado no início da audiência, por estar na mesma sala que seu advogado, o que é vedado pela legislação. O juiz percebeu essa falha e questionou o advogado da parte contrária, gerando o momento retratado no vídeo. Foi uma situação inusitada — explicou Benin ao GLOBO.
O artigo 385 do Código de Processo Civil (CPC) prevê que o homem que se escondeu não poderia estar no mesmo ambiente que o advogado porque assim ele escutaria o depoimento da parte adversária na causa. Isso ocorre para que não exista interferência nas oitivas de cada envolvido.
O caso em questão trata de um pedido de pagamento de verbas rescisórias no valor de R$ 20 mil apresentado pela mulher representada por Vitor Benin. Já o homem que apareceu em vídeo sob a mesa, defendido por Robison Maranhão, é sócio da empresa envolvida no imbróglio.
Ao GLOBO, a Ordem dos Advogados do Paraná informou que investigará o caso. “A OAB Paraná não compactua com nenhum tipo de falta de ética e abuso de direitos no exercício profissional e apurará o caso exemplarmente, de modo a proteger o bom nome da advocacia, punindo qualquer tipo de desvio da ética, do decoro e da legalidade”, declararam.
Em nota enviada à imprensa, o Tribunal Regional do Trabalho do Paraná (TRT-PR) reiterou que o juiz Thiago Mira de Assumpção Rosado irá “oficiar formalmente à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para que apure a conduta do advogado, que tentou ludibriar o magistrado e, consequentemente, a Justiça do Trabalho”. A Corte acrescentou que, “ao se esconder embaixo de uma mesa”, o sócio da empresa teve “a possibilidade de ter ouvido o depoimento da autora, o que contraria os dispositivos legais”.
“Diante do fato, o juiz suspendeu a audiência e vai programar os depoimentos das testemunhas da ação em data futura, de maneira presencial”, conclui o texto divulgado pelo TRT-PR.
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