Durante o governo Jair Bolsonaro, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) deixou prescrever uma multa ambiental de R$ 42,4 milhões de uma empresa abertamente bolsonarista. Dono da firma Real, que controla a Fazenda Chapada Grande, o empresário Tiago Junqueira mostra ser conhecido no Planalto e apoiador do presidente. Na última eleição, recebeu um vídeo de Bolsonaro e foi denunciado pelo Ministério Público Eleitoral por propaganda irregular depois de circular com o “mitomóvel”, um carro totalmente estilizado para pregar voto no então candidato do PSL.
A multa ambiental que a Fazenda Chapada Grande, em Regeneração (PI), livrou-se de pagar é a que gerou maior prejuízo aos cofres públicos, representando 12% do total de R$ 355,4 milhões das autuações que prescreveram na atual administração. A segunda maior multa vencida foi de R$ 16,6 milhões, uma diferença de 60%.
Registros internos do Ibama mostraram que a multa inicial foi aplicada à Fazenda Chapada Grande em 2005, no valor de R$ 14,1 milhões, porque a empresa recebeu 898 toneladas de madeira sem licença ambiental. A fazenda é controlada pela companhia Regeneração Agropecuária Ltda (Real).
Em 2012, com o avançar do processo, o valor da multa triplicou: passou para R$ 42,4 milhões. “Houve várias tentativas de comunicar a decisão, o que somente foi realizado em 28/05/2014”, anotou o Ibama. A Fazenda Chapada Grande, então, apresentou um recurso, que foi negado em 2017. A partir daí, o governo cometeu um erro técnico: enviou a notificação dessa decisão para uma pessoa errada. O erro só foi registrado pelo Ibama em novembro de 2019, no 11º mês da gestão Bolsonaro.
“Olá, Tiago Junqueira, de Regeneração, no Piauí. Jair Bolsonaro [falando]. Tô com o teu irmão aqui do lado, ó. Valeu, tamo junto aí nessa empreitada, tá ok? O Piauí é nosso. Valeu, garoto!”, disse Bolsonaro, na campanha de 2018.
Além de Bolsonaro, Junqueira mostra ser próximo de outra autoridade do Planalto: o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, eleito senador pelo Piauí. Em 23 de maio deste ano, uma segunda-feira, o chefe do PP foi a uma cerimônia na Fazenda Chapada Grande, onde o empresário recebeu o título de cidadão piauiense. Na agenda oficial, o ministro registrou apenas “compromissos oficiais no estado”, sem qualquer detalhe, o que é incomum em agendas do governo federal em dias úteis. Sem fazer alusão à multa aplicada pelo Ibama na gestão do PT e à prescrição ocorrida no governo Bolsonaro, Ciro disse que a família Junqueira chegou a ser “maltratada” e não recebeu incentivos suficientes.
Em uma entrevista nessa cerimônia, o empresário Tiago Junqueira fez questão de expor seu posicionamento bolsonarista. Disse Junqueira ao jornalista Elivaldo Barbosa:
“Elivaldo, você esteve aqui comigo em 2009, num dia de campo. Agora estamos aqui, 13 anos… não gosto desse número… 14 anos depois, concluindo o projeto. O agro é a grande vocação do Brasil. Hoje nós temos um presidente que é patriota, fala em Deus, em liberdade, em agro, em família. Por isso que a gente fica cada vez mais motivado em continuar trabalhando, gerando emprego, produzindo e desenvolvendo uma região tão atrasada e tão pobre como o Piauí, mas com tanta riqueza e tantas oportunidades para serem exploradas”.
Em 2018, Junqueira foi denunciado pelo Ministério Público do Piauí, junto com outros três empresários, pelos crimes de corrupção ativa e tráfico de influência. As acusações incluíam pagamento de propina a servidores da Secretaria estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos para aprovar projetos de licenciamento ambiental sem a devida análise. A Justiça, porém, rejeitou o trecho da denúncia sobre o fazendeiro. O processo foi arquivado no mês passado.
Procurados, o empresário Tiago Junqueira e a empresa Real não responderam.
Procurada, a Casa Civil não respondeu. O Palácio do Planalto disse apenas que a resposta viria do Ibama. O Ibama, por sua vez, enviou um documento referente ao processo e afirmou que a prescrição aconteceu em maio de 2019.
Paraíba da Gente com Metrópoles